BONITO É BEBER NO COPO CERTO

Estávamos no final do ano de 1977. Meu pai ainda vivia, e era o meu mestre, apesar de jogar muito duro comigo......(ainda bem, mas bem que podia ser um pouco menos!).

 

Em uma das minhas visitas ao escritório da Cisper no Rio, maior fabricante de embalagens de vidro do Brasil (garrafas e frascos), soube que a empresa estava se preparando para entrar no mercado de objetos de mesa (copos).

 

A esta altura, já representávamos algumas empresas de produtos de consumo, além da nossa tradicional linha de embalagens, e fiquei animado com a notícia.

 

Procurei saber como e quando seria este lançamento, mas o diretor comercial da empresa, JCB, me disse que a ideia era, inicialmente, vender somente aos mercados do Sul e Sudeste, e através de distribuidores, não de representantes.

 

Diante da minha insistência, ele me deu uma amostra de cada tipo de copo que iria lançar e um ou dois catálogos da Libbey, empresa americana pertencente ao mesmo grupo, de quem estavam trazendo know-how e design.

 

Chegando em Salvador, apressei-me em pensar o que fazer para me incluir naquele grupo de distribuidores. A esta altura praticamente não existiam mais representantes da divisão de embalagens de vidro, uma vez que o mercado era francamente comprador. Nós éramos um dos últimos, se não o último, e sabia que, amigos ou não, brevemente teríamos cancelado o nosso contrato de representação das embalagens de vidro. Era importante, portanto, conseguir algum novo negócio para compensar a perda iminente.

 

Procurei JPM, meu cliente e amigo, filho do Sr. Mamede Paes Mendonça e comprador da empresa Paes Mendonça, então, a maior rede de supermercados do norte e nordeste do país, contei, argumentei e pedi, e ele concordou em fazer uma pesquisa, utilizando como tema, as amostras de copos que eu havia trazido. Marcou imediatamente uma reunião a ser realizada no escritório central da empresa, para o sábado seguinte, e convocou os estoquistas de todas as suas lojas.

 

Preparei um formulário com uma série de perguntas, tipo:

 

·         quanto você pagaria por um copo desses?

·         você os compraria?

·         quantos de cada vez?

·         qual o que você gostou mais?

·         quem são os concorrentes?

 

 

 

 

 

Ao final da reunião, eu havia conseguido, em torno de trinta a quarenta repostas, altamente qualificadas, por tratar-se do pessoal que cuidava desses tipos de produtos, na loja. Na prateleira.

 

Agradeci muito a JPM. Foi, realmente, muito bom o que ele me permitiu fazer.

 

Como meu pai, eu também era chegado a uma planilha, e assim, embora ainda não tivéssemos computadores no nosso escritório - na verdade me parece que foi só a partir dai, é que começaram a fazer parte da nossa vida, coloquei numa planilha todas as opiniões, montei uma pasta, e me preparei para uma nova reunião com o diretor JCB, na próxima viagem que faria ao Rio.

 

Lembro especialmente, que este trabalho me rendeu um dos raros elogios do meu pai.

 

Eu havia deixado sobre a sua mesa a pasta que fizera, e no dia seguinte, encontrei-a presa a um clip, um bilhete, que dizia:

 

"Parabéns. É assim que se trabalha"

 

Tão logo pude, fui ao Rio, e apresentei ao JCB o meu trabalho.

 

Pelo que me lembro, ele gostou muito, prometeu estudar o assunto e marcamos uma nova reunião.

 

Meu pai viera a falecer no dia três de maio de 1978.

 

Ainda no final de maio, o JCP concordou com que eu fizesse, sem compromisso, uma espécie de teste de mercado, e eu, sem sequer ter um local para armazenagem de grandes quantidades, comprei 3.000 caixas de copos. Mas, registrou: Não garanto a continuidade de fornecimento a você; nosso objetivo continua sendo, inicialmente, atendermos os mercados do Rio e São Paulo.

 

“Voei” (nos dois sentidos) para Salvador, para resolver como e o que fazer com tantos copos!

 

E aí, usando da maior sinceridade possível, procurei o Diretor Comercial do Paes Mendonça, chefe do meu amigo JPM, às vésperas da viagem que faria à Argentina, para assistir a Copa do Mundo, e falei:

 

-Chefe, preciso de sua ajuda! Comprei 3.000 caixas de copos, nosso depósito não cabe nem 1.000, preciso vender rápido pois o prazo de pagamento que tenho é tantos dias. Meus melhores preços são estes e o prazo de pagamento que posso te dar, é X!

 

A esta altura eu tinha 29 anos, e achava que tudo podia!

 

Ele olhou sério para mim, e perguntou:

 

 

 

- Como é? E eu com isto? Você me perguntou se deveria comprar ou se eu queria comprar?

 

E falou bastante. Só não me chamou de bonito! 😌 Mas, comprou! Acho que minha agonia o sensibilizou.

 

Pediu 1.500 caixas. aos preços e condições que eu definira, e precisava. Foi um bom negócio para ambos. Quando ele voltou da Argentina, comprou o saldo, que a esta altura, permanecia armazenado na transportadora, a qual, com a promessa que fiz, de lhe dar muitas cargas no futuro, concordou em esperar que eu vendesse para tirar do seu depósito.

 

A partir daí, e durante algum tempo, fui considerado o melhor distribuidor de Copos Cisper do Brasil.

 

Paralelamente, os distribuidores do Rio e de São Paulo, não atingiram os objetivos de vendas que a Cisper necessitava, e minha área de atuação foi ampliada, passado a atingir todo o norte e nordeste do Brasil

 

Era o início de um novo negócio: distribuição de produtos de consumo.

 

Lamentei profundamente que meu pai tivesse partido, sem ter visto o final da história. Quem sabe, se vivo estivesse, poderia, até, me dedicar um novo bilhete-elogio! 😞

 

 

Salvador, 19/10/2019

 

 

 

 

Rubem Passos Segundo

rubem@rpassos.com.br

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